O inferno segundo Valentina
Atualizado: 3 de abr.
Exposição na Casa Fiat de Cultura traz 15 obras fotográficas produzidas pela artista italiana que desvenda os simbolismos do poema de Dante Alighieri.

Foto: Studio Cerri
Desvendar as alegorias e os simbolismos do poema épico A Divina Comédia, de Dante Alighieri é a proposta da exposição “O Inferno de Dante – Valentina Vannicola”. Que estreou nesta semana e vai até 28 de maio na Casa Fat de Cultura, em Belo Horizonte, com entrada gratuita.
Nesta mostra, a artista italiana transpõe cenas clássicas do Inferno, o primeiro reino de A Divina Comédia, em uma produção de 15 obras fotográficas baseadas no gênero tableau vivant. É uma tendência da fotografia contemporânea de apresentar como cenas reais as imagens construídas de acordo com a dinâmica da cinematografia. Um ambiente imersivo foi criado na Casa Fiat de Cultura para despertar o imaginário dos visitantes e proporcionar uma reflexão sobre a existência humana.
O trabalho de Valentina Vannicola conecta as novas gerações à obra daquele que é chamado de sumo poeta. Para ela, Dante ensina que é possível falar com clareza e profundidade de todas as coisas, das mais importantes às mais supérfluas.
“A Divina Comédia é uma obra imaginativa e com uma linguagem envolvente, na qual Dante orienta o leitor de modo a facilitar a visualização e materialização dos personagens e das situações descritas. Dante insere a alegoria, a grande advertência ou ensinamento político e ético e se abre para um segundo imaginário: o da interpretação. Para esta exposição, cada imagem que produzi está empenhada em traduzir o rico simbolismo do poema”, revela a artista.
Para o presidente da Casa Fiat de Cultura, Massimo Cavallo, A Divina Comédia nasceu revolucionária e segue inspirando até os dias de hoje, mais de 700 anos após a morte de Alighieri.
“Ao escrever uma jornada que navegou pelas instâncias do inferno, do purgatório e do paraíso, Dante Alighieri ultrapassou as barreiras poéticas, criou a base de uma língua e se tornou símbolo de um país. As cenas italianas, exibidas em terras mineiras, celebram esse forte diálogo entre as culturas e entre as artes, em suas mais diversas formas de expressão. Assim, reforçamos o nosso compromisso de promover diferentes reflexões e de discutir o clássico com um olhar contemporâneo”, reforça.
O trabalho da artista italiana Valentina Vannicola cria um diálogo entre literatura, cinema, teatro e fotografia. As imagens, elaboradas como tableau vivants, articulam fragmentos poéticos para evocar histórias clássicas da literatura universal em composições minuciosamente calculadas. “Para a criação das minhas imagens preciso compor a cena em frente à lente para conseguir a atmosfera certa. A fotografia encenada não registra a realidade, mas a criação de uma situação em que o artifício, a máscara, o símbolo, a técnica e a interpretação devem ser combinados para criar uma linguagem”, explica.
Valentina escolheu sua cidade natal, Tolfa, ao norte de Roma, na Itália, para a interpretação dos condenados e das punições detalhadamente descritas por Dante Alighieri. A paisagem árida, o céu acinzentado e a retórica medieval serviram de inspiração para as obras, que se destacam pela clareza dramatúrgica e pela composição em um estilo de inspiração surrealista. Cada um dos 15 registros foi filmado com uma câmera analógica Hasselblad e seus negativos foram digitalizados, pós-produzidos e impressos.
Os protagonistas das cenas são atores não profissionais, assim como no cinema neorrealista italiano e nas pinturas de Caravaggio, acrescentando às imagens uma camada social, histórica e antropológica.
Foram os moradores de Tolfa e os membros da família da artista que desempenharam o papel dos condenados e transformaram a obra em um projeto coletivo. Para os figurinos, camisas e calças de lã. O motivo, segundo a artista, foi concentrar toda a atenção na nudez das almas e nos lugares que os rodeiam.
“Na minha interpretação do Inferno de Dante, optei por eliminar de cena as figuras de Dante e Virgílio, quase como se a história fosse feita subjetivamente. Ao mesmo tempo, escolhi outro tipo de nudez, que não é a literal da carne, mas está ligada à tradição da minha terra, que é o uso de uma segunda pele, comumente usada sob as roupas para se proteger do frio durante o trabalho no campo”, explica.
Uma longa fase de estudo, entretanto, precedeu as imagens. O processo passou pelo estudo da obra literária, seleção das partes potencialmente representáveis, criação de esboços preparatórios, storyboard, identificação de locais para o cenário e, por fim, a captura das cenas. Todos esses passos estão resumidos em um grande esboço preparatório, que também estará em exibição na mostra, e retrata a representação medieval típica do Inferno, a mesma seguida por Dante.
“Em uma figura de cone invertido relatei,
de forma estilizada, os cânticos, alguns
hendecassílabos de referência, as dores que
as almas do submundo estão submetidas
e sobre as quais ao mesmo tempo tomei
nota dos locais identificados, de outras
referências técnicas e elaborei os primeiros
esboços preparatórios do que seria, então,
o clique final, a cena exata para cada
registro”, completa.
Serviço:
O Inferno de Dante – Valentina Vannicola
Local: Casa Fiat de Cultura (Praça da Liberdade, 10, Funcionários, Belo Horizonte)
Data: até 28 de maio de 2023
Visitação presencial: terça a sexta-feira, das 10h às 21h; sábados, domingos e feriados, das 10h às 18h
Tour virtual no site: www.casafiatdecultura.com.br
Fotos: Studio Cerri