• abril 25, 2025
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Entrevista: A medicina humanizada

Entrevista: A medicina humanizada

Para o cardiologista intervencionista Lucas Lodi, muito mais do que coordenar equipes e utilizar alta tecnologia, o desafio continua sendo olhar o paciente de forma mais humana

Entrevista: Lucas Lodi Minhas experiências foram essenciais para que eu me tornasse não só um médico com um pensamento crítico mas também um médico mais humano
Lucas Lodi: “Minhas experiências foram essenciais para que eu me tornasse não só um médico com um pensamento crítico mas também um médico mais humano” (Foto: Arquivo Pessoal)

 

Com sólida formação e ampla experiência na medicina, o médico Lucas Lodi é referência em cardiologia intervencionista. Mestre e doutor pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), coordena o Serviço de Hemodinâmica da Rede Mater Dei de Saúde nas unidades Contorno, Nova Lima e Betim-Contagem. Ao longo da carreira tem se destacado pela dedicação à assistência, à docência e à pesquisa, com foco em cardiopatia valvar e doença coronária. Nesta entrevista ao CIDADE CONECTA, o médico conta um pouco da sua trajetória e sua experiência como coordenador do Serviço de Hemodinâmica da Rede Mater Dei.

Ao longo da sua carreira, o que o levou a escolher a cardiologia intervencionista como foco principal e como essa decisão influenciou sua visão sobre o cuidado cardiovascular?
A escolha pela cardiologia não foi difícil. Nos meus primeiros contatos com os pacientes, ainda no quinto período da faculdade de medicina, já me encantei com a especialidade. Foi quando comecei meu primeiro estágio na área. Gostava de atender os pacientes, mas tinha uma atração especial pelos procedimentos cirúrgicos. Inicialmente, pensei em fazer cirurgia cardiovascular, mas quando conheci a cardiologia intervencionista, com todo o seu potencial, não tive a menor dúvida. Era uma área em expansão que unia minha paixão pela cardiologia, com os procedimentos e com a constante inovação tecnológica.

Sua atuação em serviços de hemodinâmica é de longa data. Quais marcos profissionais o senhor destacaria como decisivos para sua consolidação como referência na área?
São tantos anos de formação que seria até injusto citar nomes dos meus vários mentores ao longo da jornada. Foram 6 anos de faculdade, 6 anos de residência e 6 anos no mestrado e no doutorado. No entanto, não posso deixar de falar sobre alguns marcos. A Residência Médica em clínica médica e em cardiologia do Hospital das Clínicas da UFMG foram essenciais para que eu me tornasse não só um médico com um pensamento crítico, mas também um médico mais humano. Por mais que hoje em dia eu tenha me especializado em uma área eminentemente técnica, realizando procedimentos complexos e de alto risco, ainda mantendo o olhar clínico na condução do caso. Por último, mas não menos importante, os meus 16 anos à frente do Serviço de Hemodinâmica do Hospital das Clínicas da UFMG e 10 anos como coordenador do Serviço de Hemodinâmica da Rede Mater Dei de Saúde – Hub BH me trouxeram maturidade e expertise para chefiar um setor altamente complexo, com equipamentos e materiais de altíssima tecnologia, com uma equipe multidisciplinar especializada, funcionando ininterruptamente 24h por dia, 7 dias por semana.

Como a vivência simultânea na prática assistencial, na docência e na pesquisa, moldou o seu perfil profissional e a sua abordagem frente a casos complexos?
O gosto pela pesquisa clínica, que vem comigo desde a graduação, mas que se intensificou durante o mestrado e o doutorado. Além da inquietação da dúvida sobre um tema ainda desconhecido na medicina. É muito gratificante quando conseguimos chegar a uma resposta e saber que estamos ajudando a melhorar a sobrevida e a qualidade de vida da população. Já a docência, como preceptor da residência médica, vem de uma vontade de devolver tudo aquilo que aprendi. Na verdade, tenho convicção de que o maior beneficiado na docência é o próprio preceptor. Somos estimulados a estar sempre atualizados e a desenvolvermos habilidades como generosidade, empatia e criatividade, com muita humildade.

Na posição de coordenador do Serviço de Hemodinâmica da Rede Mater Dei de Saúde, quais habilidades de gestão e liderança foram mais importantes para estruturar um serviço de alta performance?
São habilidades que não aprendemos no curso de medicina. Nesses anos à frente de um serviço estratégico para a Rede Mater Dei de Saúde (RMDS), foram muitos aprendizados. Entrei para a instituição na inauguração do Hospital Mater Dei Contorno em 2014. Logo vieram as primeiras certificações. Com o processo de acreditação, desenvolvi habilidades de gestão que incorporei à coordenação, como conhecimento regulatório, gestão de processos e gestão da qualidade e segurança do paciente. Com as análises críticas realizadas periodicamente na RMDS, desenvolvi a gestão da informação para análise de dados e melhoria dos processos. Por fim, mas não menos importante, a gestão de pessoas através do treinamento e do desenvolvimento da equipe multiprofissional. A liderança é uma consequência de todo esse aprendizado, da confiança, do exemplo e de uma postura ativa e positiva frente aos desafios diários.

O senhor acompanha de perto as transformações tecnológicas na cardiologia intervencionista. Como foi o processo de incorporar inovações à prática clínica ao longo da sua carreira?
Quase 20 anos já se passaram desde quando comecei na cardiologia intervencionista. Participamos ativamente da evolução da especialidade, que tem ganhado cada vez mais espaço no tratamento de patologias cardiovasculares e pulmonares com procedimentos minimamente invasivos. Estamos em constante evolução científica e tecnológica. Para que seja possível acompanhar essas mudanças, o estudo e o aprimoramento constantes são essenciais. Vários artigos científicos, reuniões, congressos, cursos e aulas ao longo do ano. Mais importante do que conhecer e participar dessa revolução na especialidade é saber incorporar na prática toda a tecnologia e as evidências científicas de forma consciente e judiciosa para tomar decisões no cuidado individual do seu paciente.

Na formação de novos cardiologistas, como o senhor equilibra o ensino da técnica com o desenvolvimento de pensamento crítico e tomada de decisão?
Esse pensamento crítico está muito relacionado com o processo de incorporação tecnológica. A maioria dos estudos científicos são patrocinados pela indústria. Não que isso seja um problema, pelo contrário! Graças a esse investimento maciço na área é que conseguimos evoluir e melhorar o tratamento de diversas patologias! Mas precisamos fazer uma análise crítica sobre a qualidade da informação que estamos recebendo. Com os residentes, damos exatamente essas ferramentas para que eles possam usá-las ao longo de toda a sua jornada. Não adianta eu ensinar que, baseado no artigo tal, devemos tratar uma patologia com este medicamento ou com aquele procedimento, porque quando ele sair da residência, com certeza surgirá um novo artigo falando para tratar de uma forma diferente. Ensinamos, então, as ferramentas da medicina baseada em evidências. Aliado a todo esse conhecimento, para a tomada de decisão, é essencial mostrar a eles (aí tem que ser pelo exemplo) que quem está na sua frente não é um número, não é uma doença, e sim um indivíduo, um ser humano, com toda a sua complexidade bio psicoespiritual.

Quais procedimentos ou casos marcaram sua trajetória como exemplo da evolução da hemodinâmica?
Se pensarmos bem, apenas na década de 80 o infarto do miocárdio começou a ser tratado adequadamente. E apenas na década de 90 a angioplastia coronariana foi consolidada nesse contexto. Já o implante percutâneo de valva aórtica, também conhecido como TAVI, começou a ser realizado no Brasil apenas em 2008. A evolução na cardiologia intervencionista é muito rápida. Pude presenciar a maior parte desse avanço até aqui. Tantas vidas salvas…Nossa jornada é dura, mas muito gratificante.

Olhando para sua carreira até aqui, que legado o senhor gostaria de deixar — tanto para os colegas de profissão quanto para os pacientes e para a especialidade como um todo?
A cardiologia intervencionista é uma área em evolução e expansão. O aprendizado é constante. Conseguir unir esse conhecimento à ética na busca do aumento não só da quantidade, mas também da qualidade de vida dos meus pacientes é o que busco diariamente. Às vezes, as pessoas se esquecem do real conceito de saúde: um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não somente a ausência de doenças.