- junho 1, 2025
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Entrevista: Histórias bem contadas

Fundadora da escola Casa dos Quadrinhos, Doroti Seixas ressalta a importância do espaço para formação de grandes profissionais

No ano em que comemora 25 anos de história e histórias bem contadas, a “Casa dos Quadrinhos – Escola Técnica de Artes Visuais e Digitais (CDQ)” atinge um novo marco e passa a integrar o Circuito Liberdade. Essa inclusão reconhece a CDQ não apenas como uma escola de referência, mas como um importante equipamento cultural e de preservação da memória artística de Belo Horizonte. Fundada por Doroti Seixas e seu filho Cristiano Seixas, a Casa dos Quadrinhos, cujo imóvel é tombado pelo Patrimônio Histórico Municipal, nasceu para suprir uma lacuna no mercado.
Nesta entrevista ao CIDADE CONECTA, Doroti fala sobre os primeiros passos, o pioneirismo, os desafios e o impacto da escola na cena criativa mineira.
Como surgiu a ideia de fundar uma escola profissionalizante voltada para as artes visuais e digitais?
No final dos anos 1990, Belo Horizonte tinha uma cena artística muito forte, com muitos jovens talentosos desenhando, criando histórias e buscando espaço. A gente percebia uma carência: não existia um lugar que realmente preparasse esses artistas para o mercado, especialmente na área de quadrinhos e ilustração. Meu filho Cristiano tinha um estúdio que atendia a clientes de publicidade e editoras, mas não havia artistas suficientes para a crescente demanda. Não só ele como outros colegas enfrentavam essa dificuldade. Depois da faculdade, eles aprendiam muito por conta própria, tentando decifrar técnicas, errando e descobrindo caminhos, sem muita orientação do mercado. Ao conhecer a escola livre “Fábrica de Quadrinhos”, e depois de ser filial dela por um curto tempo, veio a ideia: “Por que não criar um espaço que tenha uma formação técnica, prática profissional e esse jeito mineiro de fazer arte?” A partir daí, saí de São Paulo e voltei para Belo Horizonte e a Casa dos Quadrinhos nasceu desse desejo de preencher essa lacuna. Não era só sobre ensinar a desenhar, mas sobre dar ferramentas para o artista sobreviver do seu trabalho – desde noções de narrativa até como lidar com encomendas, direitos autorais e novas tecnologias. Com o tempo, a escola foi se adaptando. As artes digitais surgiram com força, o mercado se expandiu e a gente foi ajustando os cursos para acompanhar essas mudanças. Mas o cerne sempre foi o mesmo: formar profissionais, ir além do ser artista. Hoje, quando vejo ex-alunos trabalhando em estúdios, publicando livros ou ensinando por aí, sentimos um orgulho enorme. Acho que conseguimos, de alguma forma, ajudar a fortalecer a cena artística de BH e formar uma geração que leva a sério o ofício da arte, sempre com boas histórias.
Na época da fundação, vocês tinham consciência do pioneirismo que estavam assumindo ao criar uma escola com esse perfil em Minas Gerais?
Sim, havia uma consciência clara de que a Casa estava preenchendo uma lacuna. Não existia, até então, uma escola técnica voltada especificamente para as artes visuais e digitais em Minas. O pioneirismo ficou evidente ao percebermos a grande demanda reprimida e o interesse crescente de jovens em buscar formação de qualidade nesse setor, sem ser somente por faculdades e universidades.
O que representa para você e o Cristiano a escola chegar aos 25 anos, com qualidade reconhecida, em um país que atravessou diferentes cenários econômicos?
Chegar aos 25 anos contando histórias com reconhecimento é uma conquista imensa. Em um país de instabilidades econômicas, manter uma escola com esse perfil é um feito. Significa resiliência, paixão pela arte, compromisso com o ensino e impacto real na vida de milhares de alunos. É também ver um sonho coletivo se tornar referência nacional.
O que representa para a Casa dos Quadrinhos integrar o Circuito Liberdade, consolidado como o maior ecossistema cultural, turístico, educativo e criativo da América Latina?
Integrar o Circuito Liberdade é uma honra e um reconhecimento do papel cultural da Casa. Isso a posiciona como um importante equipamento artístico da cidade, ampliando o acesso à arte e à formação. Participar desse ecossistema significa contribuir para um diálogo plural e fortalecer, ainda mais, a cena criativa mineira.
Quais profissionais que passaram pela Casa dos Quadrinhos, seja como alunos ou docentes, se destacam no mercado nacional e internacional?
A Casa formou dezenas de nomes e é muito difícil citar apenas alguns, mas, focando no mercado internacional, temos mestres como Eduardo Pansica (DC Comics), Guilherme Balbi (Avatar), Ig Guara (Marvel), Angelo Mokutan (mangaká no Japão) e Eduardo Damasceno, que trabalhou em “Wolfwalkers”, indicado ao Oscar. No cenário nacional é quase impossível listar, mas na Mauricio de Sousa Produção temos a Carol Rossetti, Rebeca Prado, além do ex-professor Vitor Cafaggi, entre outros. Muitos atuam em cinema, games, HQs e animações, consolidando-se em mercados globais.